Para aqueles que convivem comigo, já não é novidade o facto de eu estar sempre a reclamar de alguma coisa deste mundo/sociedade consumista e sem valores.
Portanto, é desta forma que eu vejo as coisas.
Vivi até aos 18 anos em Santo Antão, na Vila da Ribeira Grande (ou cidade, ou vila, ou povoado, não me interessa, importo mais com as pessoas que lá vivem). Mudei para Lisboa para me formar e 10 anos depois, ainda aqui estou.
Sempre me dei bem com todos, desde os que amo, aos que poucos sentimentos me despertam. Se alguma vez desdenhei de alguém, ou esse alguém se sentiu “pouco” por alguma atitude minha, peço perdão, pois essa não era a minha intensão, com certeza. Também sou humano e estou sujeito a errar, mas, não uso esta desculpa de “ser humano” para constantemente errar e servir-se de escudo.
Por mais que tente, não consigo deixar de questionar a veracidade de quase tudo o que vejo, no que toca a “documentários”, “ajudas humanitárias”, “planos para sair da crise” (financeira é que não é de certeza absoluta), “fundos de apoio das grandes empresas”… Dou alguns exemplos:
1 – O Ecoponto em Portugal: pedem para, cuidadosamente, separar o lixo e, cuidadosamente, depositá-lo nos posto espalhados pelo país. Não o faço e digo porquê: Não ganho nada em fazê-lo, e quando digo eu, digo todos os que o fazem, excepto as empresas que depois os transformam em produtos. Comprar um recipiente preparado para o ecoponto, custa mais de 30€ nos hipermercados, reciclo sem receber e ainda compro produtos reciclados por ai, pagando por aquilo que reciclei. Um paradoxo não é? A desculpa de que estou a ajudar o ambiente, não cola, pois se colasse, um governo que consegue ver que reciclar é bom, consegue também ver que energias renováveis são, de longe, melhores que o petróleo por exemplo, mas nem por isso deixam de o comercializar, para não perderem os benefícios financeiros que o sistema oferece.
Se queres mesmo ajudar o ambiente, recicle sim, mas transforme tu mesmo o teu produto, ou entregue-o onde sabes que vai mesmo valer a pena o teu esforço!
Quando mudarem os fins, passo a fazer parte desta ideia que podia ser, mas, não é bonita.
2 – Morrem 2 crianças, por cada 10 kg de produtos mineiros colhidos para serem transformados em playsation e outras coisas do género. Aposto que a SONY (empresa que desenvolve a playsation) tem um fundo ou um gabinete de apoio social… só para disfarçar.
3 – Vou ao supermercado na época natalícia, e não é que aproveitam até esta época para tirarem proveito do “coitado” (do ignorante, do menos culto, do pobre…), com campanhas do tipo: “ARREDONDA” – se a tua compra for 9,99€ por exemplo, os 0,01€ são arredondados ao valor a pagar, e estes 0,01€ vão para um fundo de apoio criado por estas empresas, que, ironicamente pertencem aos homens mais ricos (financeiramente, claro), do país. Até ouvi dizer que ganha bom retorno (financeiro, claro) no IRS / IUR, quem se mete a ajudar o outro. É caso para dizer: “Meu Deus do céu…”
No Mundo em que vivo, já até me cansei de sair à noite e ver o mesmo desfile de figurinos, night by night, sempre igual. Já me cansei de ver disputas e mais disputas de “nada”. “Quem bebe e aguenta mais tempo em pé?”, “Quem está mais bem vestido(a)?”, “!Quem tem mais carros e, de preferência, mais caros”, “Quem é do Gang mais temido”?, “Quem faz a dança mais suja e mais perversa?”. Nos olhos dos jovens, isso é tudo normal, porque é da época.
Minha gente, isso tudo é fruto da sociedade consumista que vivemos. Tudo tem sido preparado há muito tempo, a lavagem cerebral começou há décadas atrás.
CRISE FINANCEIRA? Nem por isso… de VALORES? Ah Pois claro. Se não vejamos:
1 – Em Cabo Verde (Ilha de Santo Antão, em particular), quem nunca ouviu estas célebres frases: “prei en de c’açucar”, “farinha já cabá”, “ta cum senhor ta vendê cebola lá sim, bé la depressa antes des cabá”? Mesmo assim, os políticos e os ditos “entendedores da matéria”, estão divididos quanto a saber se Cabo Verde está em crise ou não. Enquanto isto, Portugal que declarou estar em crise e até ajuda financeira do FMI recebe, quase nunca oiço frases parecidas. Vou ao supermercado, com muita convicção de lá encontrar o que procuro.
2 – Ah, esqueci-me que é cada vez mais difícil o português ser feliz (o cabo-verdiano está cada vez mais parecido), porque está mais complicado comprar o carro, a casa e meter lá dentro uma família, porque dá nas vistas e se projecta melhor na nossa sociedade, porque todos fazem o mesmo. Neste caso, Portugal está realmente em crise, compreendo (ironicamente, como é óbvio).
3 – Hoje, tenho até receio de dizer: “antigamente fazia-se assim, assado, cumprimentava-se as pessoas, respeitava-se os mais velhos, o próximo…” para não correr o risco de levar com uma resposta típica de quem acha que o mundo deve mudar em todos os aspectos, por ser consequência da evolução: “Tempo eh ôte môss, no ta na ôte época môss, txá de ser conservador!”. Pois é, ai mora o erro:
Quem não sabe filtrar o “Bom” e o “Mau”, vai pelo “mais comum” e espere pela sorte!
4 – A cidade da Praia, capital de Cabo Verde, não tem luz, não tem água, tem violência gratuita, e, ironicamente, somos País de Desenvolvimento médio, pois, já nos vêm com outros olhos. Mas, que olhos são estes? Olhos de que já podemos entrar no grupo dos tais e usufruir dos quais, e mesmo assim ver o aumento progressivo de problemas graves no País?
Com estes olhos, prefiro ver o meu POBRE Cabo Verde (financeiramente, claro), mas RIQUÍSSIMO em Valores, humano e cheio de morabeza, que todos nós gostamos e sempre admiramos.
5 – Enquanto isso, o Africano, o Cabo-verdiano, Santantonense, teima em ser cómodo, usando destas citações, o pão nosso de cada dia:
“Ame, já nô ta custmod, no te bé ta safá”
“Ame, ess mine dava ta contá kêl, por isso…”
“Ame, es dzê’m que en ne possível, por isso, jam desisti”
“kêl senhor(a) lá ê chei delas, êl eh um de kej boss dess lugar… Mi nunca hm te bé pode ser moda ele”
Pois é, não sejas! Seja tu mesmo, grande sim, mas a tua maneira e deixe de invejar o outro!
Se eu te der exemplos daqueles que realmente não são porque não conseguem, pensarias diferente com certeza (vê o exemplo por si mesmo, não podes esperar que sempre alguém te vai surgir, do nada, e te mostrará o caminho!).
No outro dia, em São Nicolau, reclamava com o morador do Tarrafal, o factor transporte/ligação com as outras ilhas. Na minha óptica, devia ter um barco que fazia a travessia diária para, pelo menos, um dos principais centros comerciais de Cabo Verde.
Sabem o que foi que ele me disse?:
“Ah não, tud dia não, el tava bá vazio tud dia”.
Como é que ele quer que vá cheio todos os dias, se o seu pensamento pequeno e sem perspectivas de crescimento da sua Ilha, não o permite ver que, se o barco for vazio durante 6 meses, mas mesmo assim manter o fluxo, mais investimentos surgirão, mais pessoas regressam à casa (em 10 anos, em vez de aumentar, a população diminuiu drasticamente naquela Ilha e nos demais, com excepção de Santiago, São Vicente, Sal, como é óbvio) e consequentemente, menos vazias serão as viagens diárias e consequentemente, menos isolados estarão?
Com uma única viagem semanal para São Vicente e Santiago, respectivamente, eles ainda respondem: “Ah, já foi pior“, em vez de dizer: “Hm crê melhor e não menos pior“
Pergunta que não quer calar:
PREFERES TER BOA PINTA E NÃO TER SOSSEGO, OU SER “FEIO” E SER FELIZ?
Por Délio Leite (Déy)

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